Direito MédicoTRANSFUSÃO SANGUÍNEA – TESTEMUNHAS DE JEOVÁ: CFM OPÕE EMBARGOS CONTRA TESE QUE PERMITE RECUSA DE TRANSFUSÃO

6 de dezembro de 20240

(imagem IA)

Autarquia requer que a decisão seja complementada para sanar suposta omissão no julgado em relação a situações emergenciais

O Conselho Federal de Medicina (CFM) opôs, nesta terça-feira (3/12), embargos de declaração no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a tese fixada no Tema 952 (RE 979742), que trata do direito à realização de cirurgias sem transfusão de sangue para pacientes Testemunhas de Jeová, com o objetivo de que a decisão seja complementada para sanar suposta omissão no julgado em relação a situações emergenciais.

Como exemplo, o CFM menciona quando não se tem inequívoca certeza da opção do paciente testemunha de Jeová na transfusão sanguínea, bem como quando da oposição da família no tratamento, quando o paciente se encontrar inconsciente.

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Além disso, a autarquia federal requereu sua admissão na ação como assistente simples, nos termos do art. 119 do CPC. Conforme argumenta o CFM, a intervenção de terceiros, na condição assistente, é necessária tendo em vista a repercussão da matéria na atividade dos médicos brasileiros, aos quais incumbe, na ponta da assistência à saúde, cumprir, na esfera que lhe compete, a decisão proferida pelo STF.

No RE 979742, de relatoria do ministro Luís Roberto Barroso, foi decidido que as Testemunhas de Jeová têm permissão para recusar transfusões de sangue, desde que essa negativa preencha requisitos como o paciente ser maior de idade, capaz e em condições de discernimento. No julgamento, foi definida a seguinte tese:

“1. Testemunhas de Jeová, quando maiores e capazes, tem o direito de recusar o procedimento médico que envolva transfusão de sangue com base na autonomia individual e na liberdade religiosa.

  1. Como consequência, em respeito ao direito à vida e à saúde, fazem jus aos procedimentos alternativos disponíveis no SUS. Podendo, se necessário, recorrer a tratamento fora de seu domicílio.”

 

Entretanto, de acordo com o CFM, apesar destas premissas estabelecidas no voto, ainda restam diversas situações de insegurança ao médico, que será quem dará cumprimento ao quanto decidido.

“Na relação médico/paciente inicialmente se garante ao paciente a sua autonomia para concordar ou não com o tratamento proposto pelo médico, após ser devidamente informado sobre sua condição de saúde, as alternativas de tratamento e a melhor opção a ser seguida, o que se denomina ‘consentimento livre e esclarecido’”, diz o CFM em trecho do documento.

Porém, argumenta que a questão se torna mais complexa em face do risco iminente à vida, quando tal solução não possa ser adotada e se estará, de um lado, diante do direito da autonomia do paciente e do outro do direito à objeção do médico. “Esta, portanto, é a omissão ora apontada no presente julgado: o risco iminente à vida. Apesar de ter sido mencionado pelo relator como “fato relevante”, na tese fixada, tal importante fato não restou contemplado, razão pela qual, dada a condição de Repercussão Geral, conferida ao julgado, é imprescindível que tal informação conste no acórdão”, afirma.

Impossibilidade do consentimento e familiares contrários à transfusão de sangue

No documento, a autarquia também cita que há outras situações fáticas que dificultam ao médico a implementação do direito fixado na tese. Em alguns casos, o CFM ilustra que há pacientes que chegam ao serviço de saúde impossibilitados de exprimir a sua vontade – a exemplo dos que chegam inconscientes e sem qualquer declaração documental que ateste o seu desejo contrário à transfusão de sangue, ainda que em risco de vida.

“Dessa forma, como o médico poderia obter do paciente o seu consentimento livre e esclarecido?”, indaga o CFM. “Diferente disso, é a família que pressiona o médico a seguir o que se presumiria ser a vontade do paciente. Além disso, não se pode saber, com a precisão que o caso exige, se naquela circunstância específica o paciente iria anuir ou não com o tratamento”, diz.

Há ainda, de acordo com o CFM, a questão de quando o risco iminente de vida se alia à impossibilidade de se obter o consentimento livre e esclarecido, em relação à transfusão de sangue, o que complexifica ainda mais a decisão. Por essa razão, também solicitou que o ministro Barroso inclua em seu voto a ressalva feita no julgamento do RE 979742, em que ele afirmou que o consentimento válido é para si e não para terceiros.

Também elencou que outro ponto que desafia a decisão proferida pelo STF é a objeção de tratamento de transfusão de sangue/manifestação de familiares contrários ou favoráveis ao procedimento. “O que se aponta nesse caso, que longe de ser exceção, faz parte do dilema de muitos médicos acerca da possibilidade de a família suprir o consentimento livre e esclarecido quando o paciente não possa exprimir sua vontade”, afirma o CFM.

“A ausência na tese de Repercussão Geral acerca de tal fato fragiliza a segurança jurídica do médico atender o paciente sob essas condições, que além do rigor empregado para salvar a vida do paciente, ainda estará com o stress advindo da pressão dos familiares e as ameaças de processos judiciais”, declara a autarquia.

Fonte: JOTA – Mirielle Carvalho

 

 

 

 

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